sábado, 1 de março de 2014

Rafinha Bastos e APAE: o Hotel Mercure já ensinou como se faz



Não é necessário criminalizar a babaquice, mas a sociedade pode sim endossar que a babaquice é o que é: babaca. Penso que isso é culturalmente útil.

A APAE perdeu a ação judicial contra o humorista Rafinha Bastos. Pronto, é hora de todos nós que gostamos de por a boca no trombone a respeito da sociedade nos posicionarmos. A minha posição a respeito de piadas e processos eu deixo bem clara no começo desse texto: piada de mau gosto é piada de mau gosto, não crime.
Todavia, penso que há sim utilidade em se dizer quando uma piada é de mau gosto num determinado contexto. É uma questão pedagógica para a civilidade, ainda mais quando temos alguns humoristas que acham que só é possível se fazer rir quando se goza justamente daqueles que já sofrem bastante no dia-a-dia.


Sobre a APAE e Rafinha Bastos, vendo vídeos e lendo textos sobre o caso por aí, há quem diga que a APAE exagerou pois a piada não denigre a instituição. Concordo que a APAE exagerou quando judicializou a questão, todavia, dizer que a piada não causa nenhum prejuizo à APAE como instituição é besteira. Creio que, para quem diz isso, um aspecto da piada feita pelo humorista em seu DVD "A Arte do Insulto" está passando em branco: a piada depende da relação que se faz entre APAE e a palavra "retardado".


Ora, quem conhece a APAE e as famílias de pessoas com deficiência mental sabe que uma das maiores lutas, inclusive da instituição, é pela inclusão. Isso passa por um combate contra a palavra "retardado", que é de sentido altamente pejorativo e marginalizante. A palavra "queer" já foi assim para os gays, mas com mobilização eles conseguiram dar a volta por cima. Sendo assim, essa piada do Rafinha reforça sim algo de muito ruim quando usa dessa palavra.


Nesse contexto, penso que o que a APAE poderia fazer não é processar. Creio que isso também vale para diversas outras causas que tem de lidar com humoristas do tipo "politicamente incorreto" (a.k.a "babaca"). Processar logo de cara é uma atitude ruim porque potencialmente criminaliza piadas e é antipática. Ela traz consigo o risco da censura amparada legalmente, assim como uma posição institucional que se mostra fechada para o diálogo. 


O que se pode fazer, ao invés disso, é se usar da comunicação social numa ação de relações públicas. Pega-se uma dose do que os gays fizeram com a palavra "queer", por exemplo, e junta-se isso numa boa ação de comunicação institucional.


Isso não é nenhuma novidade no ramo da comunicação e nem mesmo para o Rafinha. Lembram da cacetada que o Hotel Mercure deu no humorista pelo Twitter no ano passado? Esse é o tipo de ação de comunicação institucional que, creio eu, é muito útil nesses casos. Afinal, não se processa e, além disso, a organização se retroalimenta da piada em termos de imagem e opinião pública sem qualquer prejuízo: "A trip to Belize".

De fato, o
vídeo feito por pessoas com deficiência para o Rafinha Bastos, e que foi bem compartilhado nas redes sociais, já foi um avanço nesse sentido comunicacional. Todavia, creio que as instituições em si poderiam avançar mais nesse sentido que estou propondo de se posicionarem publicamente mais abertas ao diálogo e de maneira mais "esportiva", com fair play, se utilizando da comunicação institucional de maneira inteligente e estratégica. O segredo é tornar casos como esse antes questão de Relações Públicas do que de advogados.

Sendo assim, a APAE poderia fazer uma carta aberta ao Rafinha se utilizando do humor, por exemplo, dando um jeito de subverter essa palavra "retardado". É uma sugestão. O importante é que a ação fosse uma resposta institucional "levando na esportiva", mas ao mesmo tempo ácida, pois isso seria um tapa de luvas na cara do Rafinha e muito útil para a causa e imagem da APAE.

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